Emílio Moura

Permanência da Poesia

Quando a luz desaparecer de todo,
mergulharei em mim mesmo e te procurarei, lá dentro.
A beleza é eterna.
A poesia é eterna.
A liberdade é eterna.
Elas subsistem, apesar de tudo.
É inútil assassinar crianças. É inútil atirar aos cães
os que, de repente, se rebelam, e erguem a cabeça olímpica.
A beleza é eterna. A poesia é eterna. A liberdade é eterna.
Podem exilar a poesia: exilada, ainda será mais bela.
As crianças a recolherão no espírito e ela ressurgirá mais límpida.
As horas passam, os homens caem,
a poesia fica.
Aproxima-te e escuta:
Há uma voz na noite!
Olha:
É uma luz na noite!


Calmaria

Água estagnada
nuvem parada,
folha perdida,
pássaro de asa
partida.
Ó vento que morreis,
de leve, de leve,
despertai!
Luz que se apaga,
sombra diluída,
névoa que vaga,
voz que se cala,
ferida.
Ó voz que adormeceis
de manso, de manso,
gritai, gritai!
Tímida esperança,
pálido desejo:
a tarde tão mansa,
tão lânguida a noite
que vem.
Ó alma náufraga,
como tudo o mais:
desesperai!


Poema

Renasces em ti mesma e por ti mesma.
Movimentas o sonho, a poesia e as aventuras imprevisíveis.
O imponderável é a tua matéria.
A poesia só me visita para que te realizes,
para que eu te sinta e te compreenda.
Que caminhos te prendem,
que ignotas rotas te iluminam?
Uma rosa se forma entre o teu sorriso e a aurora.
De repente,
tudo se torna tão irreal
que te sinto visível.


Exílio

Já nada vejo nessa bruma
que ora te esconde.
Quero encontrar-te, mas à noite
não me traz nenhuma
esperança de onde nem quando.
Amor, ah, quanto me deves!
Que é dos pés que, leves, leves,
roçaram por este chão?
Alma, és só tempo e solidão.